Literatura
“É urgente que todas as pessoas que desejam que a sua língua perdure e floresça, como diria Castelao, conheçam a obra de Carvalho Calero”

O  roteirista de Ricardo Carvalho Calero: Coraçom de terra, Xico Paradelo, fala da nova banda desenhada sobre a vida e obra de uma das figuras mais importantes da cultura galega do século XX.

Banda diseñada Calero
22 may 2020 08:00

Na história da filologia galega, que papel achas que lhe corresponde a Carvalho Calero?
Carvalho é, sem dúvida, uma das máximas figuras, se não a maior. Ele foi o primeiro catedrático de língua galega. Realmente, podemos dizer que ele foi o fundador da filologia galega. Da sua autoria são obras tão importantes como a História da literatura galega contemporánea (1963), ou Gramática elemental del gallego común (1966), livros que, em boa medida, continuam a ser referência obrigada na atualidade. Também foi o autor de ensaios fundamentais como Problemas da língua galega (1981) ou Da fala e da escrita (1983), estudos sobre os quais se alicerça a chamada “alternativa reintegracionista” para a nossa língua.

Por que pensas que a Academia tardou tanto tempo em adicar-lhe o Dia das Letras Galegas?
É uma boa pergunta. Estaria bem que a RAG no-lo explicasse algum dia. Na base desta berrante anomalia está, acho eu, o cerne de um conflito de longa data e extremamente pernicioso para o presente e o futuro da nossa língua. Eu espero e desejo que com a designação de Carvalho para as Letras deste ano (e devia ser também no próximo dada a crise sanitária) se abra, por fim, uma nova fase que nos permita chegar a um consenso amplo para reorientar a trajetória do galego no sentido que Carvalho deixou bem traçado. Temos que reler os seus textos e aplicar o que neles se prescreve. São totalmente atuais e fornecem-nos uma oportunidade única. 

Carvalho, nos seus textos sobre a língua, deixou as chaves para construir um caminho seguro para garantir o futuro da mesma.

Representar a figura de Calero, poderia animar o debate sobre a normativa da língua?
Oxalá. Precisamente o que enfraquece a saúde da nossa língua, em boa medida, é a falta desse debate; a patrimonialização da norma linguística que se tem feito por uma parte e a marginalização absoluta da outra parte, precisamente, a parte que quer aplicar as ideias e propostas de Carvalho Calero. O que Carvalho propunha era abrir esse debate em positivo sobre o presente e o futuro do galego e chegar entre todos e todas a conclusões que nos permitissem achar soluções aos graves problemas que ameaçam a nossa língua no seu berço, a Galiza.

Por que é importante recuperar a vida de um intelectual como Carvalho Calero?
Em primeiro lugar pola sua importância maiúscula para a nossa língua e cultura. Carvalho é uma das figuras mais importantes da cultura galega do século XX. Foi poeta, narrador, dramaturgo, historiador da língua, crítico, filólogo, professor, ensaísta… E em todos estes aspetos, a sua obra é da máxima qualidade.

Mas, em segundo lugar, e acho que é ainda mais importante, porque Carvalho, nos seus textos sobre a língua, deixou as chaves para construir um caminho seguro para garantir o futuro da mesma. E, infelizmente, foi marginalizado e as suas propostas foram sistematicamente ocultadas e mesmo tergiversadas e combatidas com dureza, impedindo que as galegas e os galegos pudéssemos ter acesso a elas e, portanto, saber da sua existência. Levamos mais de trinta anos perdidos, polo que é urgente que todas as pessoas que desejam que a sua língua perdure e floresça (como diria Castelao) conheçam a obra desta personalidade. Com a nossa banda dseseñada, o que queremos é isto: animar as pessoas a conhecerem mais sobre Carvalho e sobre as ideias que ele transmitia.


Quen forma a equipa de trabalho de Coraçom de terra?
Eu diria que temos duas equipas: a equipa que desenvolveu na prática este projeto e a equipa enorme de pessoas que fizeram possível ao longo do tempo que este projeto pudesse existir. Na primeira equipa estaria Iván Suárez, o desenhador; Irene Veiga, Carlos Rafael Ramos e eu mesmo, como roteiristas; os editores Manel Cráneo e Valentim R. Fagim; também o Germam Ermida, que fijo de tudo e tudo bem; os assessores Tiago Peres Gonçalves e Ernesto Vasques Souza bem como Brandán González Coruxo, o nosso assistente de design.

Na segunda equipa estariam muitíssimas pessoas, mas por citar só algumas: Maria Victoria Carballo-Calero Ramos e família, Martinho Montero Santalha, Ramom Reimunde Norenha, Biblioteca Fontenla (AGLP), Família Fontenla, Casa da Língua Comum, Pilar Pallarés García, J. Manoel Afonso Noceda (Rube), Ramom Pinheiro Almuinha (Chito), Xoán Curiel, José Luís Fernández Carnicero, Paulo Fernandes Mirás, Vicente Araguas Álvarez, Xavier Alcalá Navarro, Xulio Pardo de Neyra, Frente Comixário, BD Banda, Academia Galega da Língua Portuguesa (AGLP), Movimento Defesa da Língua (MDL) e a Associaçom Galega da Língua (AGAL).

Como foi o trabalho de documentação histórica? 
Foi muito exigente. Contamos em todo momento com a assessoria dos professores Tiago Peres e Ernesto V. Souza. Mas, ainda assim, para irmos reconstruindo os diferentes momentos da vida do professor Carvalho que relatamos na obra, tivemos que mergulhar em dúzias e dúzias de livros. Consultamos centenares de webs e trabalhos online, falamos com testemunhas, recolhemos episódios vitais, visionamos documentários e outros materiais audiovisuais, hemerotecas… Foi um árduo labor que se prolongou durante vários meses e que chegou a pôr a prova as nossas forças, mas, finalmente, viu-se recompensado com esta formosa obra. Agora só esperamos que a gente goste dela.

Que aportações oferece a banda desenhada na narrativa histórica? 
A técnica da banda desenhada permite dotar as narrações históricas de um contexto rápido e claro, para além de dar-lhes rosto e caráter aos personagens que se abordam. O desenho e a narração gráfica enriquecem muito o relato e acrescentam muitos matizes. Nós precisamente pretendíamos achegar uma visão dos aspetos mais humanos de Carvalho, tentar que o leitor se pusesse na sua pele e pudesse sentir as suas derrotas e esperanças em diferentes momentos da sua vida

Esta não é uma obra que pretenda mostrar uma biografia rigorosa nem uma visão histórica totalmente fiel e objetiva. Tem momentos totalmente ficcionais e novelescos, como o primeiro episódio, em que nos permitimos imaginar um jovem Ricardo Carvalho a viver aventuras no seu Ferrol Velho natal. Outros passagens foram elaborados a partir das próprias memórias do professor… O objetivo foi transformar a vida de Ricardo Carvalho Calero numa obra de banda desenhada que fosse amena e acessível para todas aquelas pessoas interessadas nela e também criar um relato o suficientemente atrativo e interessante para aquelas outras que não conheçam a figura do professor e estejam interessados em iniciar-se nela. 


Que significa para vós ter superado a meta do crowdfunding?
Foi inacreditável. Já nos primeiros três dias batemos o nosso objetivo inicial, que era de 2500 euros. Mas nunca esperamos chegar ao final do processo com mais de 9000 euros. Queremos agradecer a todas as pessoas que nos apoiaram, tanto no Verkami, como difundindo o projeto nas redes sociais e de muitos outros jeitos. Também aos meios que, como o vosso, tiveram a amabilidade de se interessar por esta obra. Toda essa gente faz parte também da segunda equipa de que che falava anteriormente.

A obra tinha já a sua edição garantida graças ao trabalho de Demo e de Através, ao apoio da Associação BD Banda e mais ao contributo de diferentes concelhos e instituições. Mas quando a vimos acabada, pensamos que o trabalho gráfico de Iván merecia uma edição realmente de luxo, e apostamos polo crowdfunding para poder fazer realidade esse formato. Capa dura, tamanho A4... O processo permitiu-nos comprovar o enorme interesse que há por Carvalho Calero e mais por uma obra destas características. Sentimo-nos muito apoiados.

Quando tendes programada a publicação da obra?
Neste momento está já no prelo. Esperamos tê-la nas mãos para finais deste mês ou começos de junho. Enquanto nos chegar, começaremos a enviar os exemplares às pessoas que apoiaram o crowdfunding e às livrarias. Depois temos previsto começar com as apresentações, se este maldito andaço da COVID nos deixa.

Informar de un error
Es necesario tener cuenta y acceder a ella para poder hacer envíos. Regístrate. Entra na túa conta.

Relacionadas

Galicia
Galicia La TVG se gasta 839.772 euros en un programa de Miguel Lago y deja de emitir nuevas entregas tras hundirse en audiencia
El programa ‘O novo rei da comedia’ apenas llegó a los 36.000 espectadores de media en su estreno y cayó en picado en su hasta ahora última emisión al 3,4% de cuota de pantalla en una cadena que tuvo de cuota media en marzo un 8,1%.
Lugo
Lugo Os sindicatos esixen a Traballo que tome medidas no “peche patronal” de Sargadelos
O dono, Segismundo García, permitiu a entrada de case todo o persoal tras catro días do que cualifican de “chantaxe”. Desde CCOO e CIG denuncian que este mércores “ignorouse a 12 traballadores”.
Galicia
Galicia Los sindicatos exigen a Trabajo que tome medidas en el “cierre patronal” de Sargadelos
El dueño, Segismundo García, ha permitido la entrada de casi toda la plantilla tras cuatro días de lo que califican de “chantaje”. Desde CCOO y CIG denuncian que este miércoles se ha “ninguneado a 12 trabajadores”.
Palestina
Genocidio Israel sigue atacando hospitales, la ONU habla del peor momento en los 18 meses de asedio
No hay tregua en Gaza, donde Israel ha recrudecido las matanzas y sigue sin permitir el acceso de alimentos y productos de primera necesidad. La ONU denuncia asimismo el asesinato de más de 70 civiles en Líbano.
Grecia
Grecia Frontex pone de nuevo la mirada en Grecia
En enero de 2025 el Tribunal Europeo de Derechos Humanos acusó a las autoridades griegas de llevar a cabo devoluciones forzadas de manera sistemática.
O Teleclube
O Teleclube 'Sorda' o debut persoal de Eva Libertad chega a 'O Teleclube'
A directora murciana estrea a súa ópera prima ao carón da súa irmá e protagonista, Mariam Garlo.
Crisis climática
Balance climático El Mediterráneo se consolida como zona especialmente vulnerable al cambio climático
Las víctimas de la dana suponen dos tercios de las muertes por fenómenos extremos en Europa en 2024, según un informe conjunto de Copernicus y la Organización Meteorológica Mundial que hace un balance climático del continente el pasado año.
Opinión
Opinión La coherencia de las políticas de Trump
No se pueden entender los aranceles de Trump sin su lucha por el control de los recursos minerales, sin Groenlandia, Ucrania o la República Democrática de Congo.
Comunidad de Madrid
Memoria histórica Contra la basura y el olvido: tras la pista de los cuerpos y de la memoria de los brigadistas internacionales
El Salto acompaña a un contingente internacional de políticos, políticas y activistas en una ruta en memoria de los brigadistas internacionales que acudieron a luchar a España contra el fascismo, en un ejercicio inspirador para el presente.

Últimas

Barcelona
Barcelona Activistas de los derechos humanos piden la retención de un barco dispuesto para armar a Israel
La naviera Maersk está transportando estos días componentes para los cazas F-35. El Estatuto de Roma sobre genocidio contempla acciones legales contra las empresas que favorecen las masacres.
Partidos políticos
CIS de abril La ultraderecha recorta votos al PP arrastrada por el efecto Trump
El barómetro de abril vuelve a situar al PSOE como fuerza más votada. La izquierda española sigue su contienda por todo lo bajo.
El Salto n.78
El Salto 78 Nueva revista, viejas injusticias: hablemos de Violencia Institucional
En el último número de la revista de El Salto dedicamos la portada y nuestro “Panorama” a una de las violencias que sufren las mujeres solo por el hecho de serlo, la que aún a día de hoy emana de un sistema irracional y patriarcal.
Comunidad de Madrid
Educación El Gobierno de Ayuso deberá pagar 1.000 euros a una profesora por el exceso de horas lectivas
Según CCOO, hasta 6.500 profesoras y profesoras se podrán acoger a esta sentencia que supone una penalización a la Comunidad de Madrid por el exceso de horas extras que realiza el profesorado.
Ayuntamiento de Madrid
Huelga de basuras Huelga indefinida de basuras en Madrid desde el 21 de abril tras romperse las negociaciones
Los representantes sindicales fuerzan el paro para obligar a las empresas subcontratadas por el Ayuntamiento a escuchar sus propuestas. El Ayuntamiento fija servicios mínimos del 50 %.

Recomendadas

Poesía
Culturas Joan Brossa, el mago que jugó con la poesía para reinventar el poder de la palabra
Casi inabarcable, la producción creativa de Joan Brossa se expandió a lo largo —durante medio siglo XX— y a lo ancho —de sonetos a piezas teatrales, pasando por carteles o poemas objeto— para tender puentes entre el arte, la política y el humor.
República del Sudán
Sudán Cara a. Un Sudán en guerra
Se cumplen dos años de una guerra que ya deja más de 13 millones de personas desplazadas y más de ocho millones de sudaneses al borde de la inanición.
Galicia
Galicia La TVG se gasta 839.772 euros en un programa de Miguel Lago y deja de emitir nuevas entregas tras hundirse en audiencia
El programa ‘O novo rei da comedia’ apenas llegó a los 36.000 espectadores de media en su estreno y cayó en picado en su hasta ahora última emisión al 3,4% de cuota de pantalla en una cadena que tuvo de cuota media en marzo un 8,1%.
Globalización
Crisis del multilateralismo El terremoto Trump sacude las instituciones del orden mundial y la “globalización feliz”
Muchas de las instituciones que marcaron la vida internacional desde la caída del Muro han entrado en crisis. ¿Todas? No, especialmente aquellas que intentan regular los derechos humanos, de los pueblos y de la naturaleza.