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Literatura
“É urgente que todas as pessoas que desejam que a sua língua perdure e floresça, como diria Castelao, conheçam a obra de Carvalho Calero”
O roteirista de Ricardo Carvalho Calero: Coraçom de terra, Xico Paradelo, fala da nova banda desenhada sobre a vida e obra de uma das figuras mais importantes da cultura galega do século XX.
Na história da filologia galega, que papel achas que lhe corresponde a Carvalho Calero?
Carvalho é, sem dúvida, uma das máximas figuras, se não a maior. Ele foi o primeiro catedrático de língua galega. Realmente, podemos dizer que ele foi o fundador da filologia galega. Da sua autoria são obras tão importantes como a História da literatura galega contemporánea (1963), ou Gramática elemental del gallego común (1966), livros que, em boa medida, continuam a ser referência obrigada na atualidade. Também foi o autor de ensaios fundamentais como Problemas da língua galega (1981) ou Da fala e da escrita (1983), estudos sobre os quais se alicerça a chamada “alternativa reintegracionista” para a nossa língua.
Por que pensas que a Academia tardou tanto tempo em adicar-lhe o Dia das Letras Galegas?
É uma boa pergunta. Estaria bem que a RAG no-lo explicasse algum dia. Na base desta berrante anomalia está, acho eu, o cerne de um conflito de longa data e extremamente pernicioso para o presente e o futuro da nossa língua. Eu espero e desejo que com a designação de Carvalho para as Letras deste ano (e devia ser também no próximo dada a crise sanitária) se abra, por fim, uma nova fase que nos permita chegar a um consenso amplo para reorientar a trajetória do galego no sentido que Carvalho deixou bem traçado. Temos que reler os seus textos e aplicar o que neles se prescreve. São totalmente atuais e fornecem-nos uma oportunidade única.
Carvalho, nos seus textos sobre a língua, deixou as chaves para construir um caminho seguro para garantir o futuro da mesma.
Representar a figura de Calero, poderia animar o debate sobre a normativa da língua?
Oxalá. Precisamente o que enfraquece a saúde da nossa língua, em boa medida, é a falta desse debate; a patrimonialização da norma linguística que se tem feito por uma parte e a marginalização absoluta da outra parte, precisamente, a parte que quer aplicar as ideias e propostas de Carvalho Calero. O que Carvalho propunha era abrir esse debate em positivo sobre o presente e o futuro do galego e chegar entre todos e todas a conclusões que nos permitissem achar soluções aos graves problemas que ameaçam a nossa língua no seu berço, a Galiza.
Por que é importante recuperar a vida de um intelectual como Carvalho Calero?
Em primeiro lugar pola sua importância maiúscula para a nossa língua e cultura. Carvalho é uma das figuras mais importantes da cultura galega do século XX. Foi poeta, narrador, dramaturgo, historiador da língua, crítico, filólogo, professor, ensaísta… E em todos estes aspetos, a sua obra é da máxima qualidade.
Mas, em segundo lugar, e acho que é ainda mais importante, porque Carvalho, nos seus textos sobre a língua, deixou as chaves para construir um caminho seguro para garantir o futuro da mesma. E, infelizmente, foi marginalizado e as suas propostas foram sistematicamente ocultadas e mesmo tergiversadas e combatidas com dureza, impedindo que as galegas e os galegos pudéssemos ter acesso a elas e, portanto, saber da sua existência. Levamos mais de trinta anos perdidos, polo que é urgente que todas as pessoas que desejam que a sua língua perdure e floresça (como diria Castelao) conheçam a obra desta personalidade. Com a nossa banda dseseñada, o que queremos é isto: animar as pessoas a conhecerem mais sobre Carvalho e sobre as ideias que ele transmitia.
Quen forma a equipa de trabalho de Coraçom de terra?
Eu diria que temos duas equipas: a equipa que desenvolveu na prática este projeto e a equipa enorme de pessoas que fizeram possível ao longo do tempo que este projeto pudesse existir. Na primeira equipa estaria Iván Suárez, o desenhador; Irene Veiga, Carlos Rafael Ramos e eu mesmo, como roteiristas; os editores Manel Cráneo e Valentim R. Fagim; também o Germam Ermida, que fijo de tudo e tudo bem; os assessores Tiago Peres Gonçalves e Ernesto Vasques Souza bem como Brandán González Coruxo, o nosso assistente de design.
Na segunda equipa estariam muitíssimas pessoas, mas por citar só algumas: Maria Victoria Carballo-Calero Ramos e família, Martinho Montero Santalha, Ramom Reimunde Norenha, Biblioteca Fontenla (AGLP), Família Fontenla, Casa da Língua Comum, Pilar Pallarés García, J. Manoel Afonso Noceda (Rube), Ramom Pinheiro Almuinha (Chito), Xoán Curiel, José Luís Fernández Carnicero, Paulo Fernandes Mirás, Vicente Araguas Álvarez, Xavier Alcalá Navarro, Xulio Pardo de Neyra, Frente Comixário, BD Banda, Academia Galega da Língua Portuguesa (AGLP), Movimento Defesa da Língua (MDL) e a Associaçom Galega da Língua (AGAL).
Como foi o trabalho de documentação histórica?
Foi muito exigente. Contamos em todo momento com a assessoria dos professores Tiago Peres e Ernesto V. Souza. Mas, ainda assim, para irmos reconstruindo os diferentes momentos da vida do professor Carvalho que relatamos na obra, tivemos que mergulhar em dúzias e dúzias de livros. Consultamos centenares de webs e trabalhos online, falamos com testemunhas, recolhemos episódios vitais, visionamos documentários e outros materiais audiovisuais, hemerotecas… Foi um árduo labor que se prolongou durante vários meses e que chegou a pôr a prova as nossas forças, mas, finalmente, viu-se recompensado com esta formosa obra. Agora só esperamos que a gente goste dela.
Que aportações oferece a banda desenhada na narrativa histórica?
A técnica da banda desenhada permite dotar as narrações históricas de um contexto rápido e claro, para além de dar-lhes rosto e caráter aos personagens que se abordam. O desenho e a narração gráfica enriquecem muito o relato e acrescentam muitos matizes. Nós precisamente pretendíamos achegar uma visão dos aspetos mais humanos de Carvalho, tentar que o leitor se pusesse na sua pele e pudesse sentir as suas derrotas e esperanças em diferentes momentos da sua vida
Esta não é uma obra que pretenda mostrar uma biografia rigorosa nem uma visão histórica totalmente fiel e objetiva. Tem momentos totalmente ficcionais e novelescos, como o primeiro episódio, em que nos permitimos imaginar um jovem Ricardo Carvalho a viver aventuras no seu Ferrol Velho natal. Outros passagens foram elaborados a partir das próprias memórias do professor… O objetivo foi transformar a vida de Ricardo Carvalho Calero numa obra de banda desenhada que fosse amena e acessível para todas aquelas pessoas interessadas nela e também criar um relato o suficientemente atrativo e interessante para aquelas outras que não conheçam a figura do professor e estejam interessados em iniciar-se nela.
Que significa para vós ter superado a meta do crowdfunding?
Foi inacreditável. Já nos primeiros três dias batemos o nosso objetivo inicial, que era de 2500 euros. Mas nunca esperamos chegar ao final do processo com mais de 9000 euros. Queremos agradecer a todas as pessoas que nos apoiaram, tanto no Verkami, como difundindo o projeto nas redes sociais e de muitos outros jeitos. Também aos meios que, como o vosso, tiveram a amabilidade de se interessar por esta obra. Toda essa gente faz parte também da segunda equipa de que che falava anteriormente.
A obra tinha já a sua edição garantida graças ao trabalho de Demo e de Através, ao apoio da Associação BD Banda e mais ao contributo de diferentes concelhos e instituições. Mas quando a vimos acabada, pensamos que o trabalho gráfico de Iván merecia uma edição realmente de luxo, e apostamos polo crowdfunding para poder fazer realidade esse formato. Capa dura, tamanho A4... O processo permitiu-nos comprovar o enorme interesse que há por Carvalho Calero e mais por uma obra destas características. Sentimo-nos muito apoiados.
Quando tendes programada a publicação da obra?
Neste momento está já no prelo. Esperamos tê-la nas mãos para finais deste mês ou começos de junho. Enquanto nos chegar, começaremos a enviar os exemplares às pessoas que apoiaram o crowdfunding e às livrarias. Depois temos previsto começar com as apresentações, se este maldito andaço da COVID nos deixa.
Ilustración
Xico Paradelo: “Unha lingua existe se é útil”
Entrevistamos a un dos referentes da banda deseñada en galego.